Extra! Extra! Advogados abandonam Juntas Comerciais!


Publicado em:
14/08/2023
Ismael Rohrig
Ismael Rohrig
Advogado

Confesso que o título deste post pode até parecer exagerado, mas acredite, não é.

Em minha passagem pela Forjas Taurus S.A. (sociedade anônima de capital aberto, listada no Nível 2 da BM&F Bovespa) e pelo Grupo RBS (Grupo com mais de 16 Sociedades Anônimas) tive a oportunidade de me aproximar mais das atividades das denominadas Juntas Comerciais. Após esta aproximação (intensa diga se de passagem), passei a conviver cada vez mais com estes órgãos, e assim, pude não somente a aprender suas formas de trabalho, mas também entender o porque de certas coisas.

Você pode não acreditar, mas estes órgãos são uma baita escola de direito empresarial e societário.

As Juntas Comerciais, foram criadas com o advento da Lei 8.934/94. Esta lei, teve por objetivo organizar e regulamentar as questões referentes aos registros públicos de empresas, criando também o Sistema Nacional de Registro de Comércio (Sinrem) e o Departamento Nacional de Registro de Comércio (a criação destas estruturas esta positivada no Art. 3º da Lei).

Mas o que fazem as Juntas Comerciais?

Como dito antes, estes órgãos são responsáveis por todos os registros públicos de empresas mercantis. Vamos pegar para exemplo as sociedades Limitadas (Ltda.) e Anônimas (S.A.).

Quando você constitui uma empresa, você precisa ter o Ato de Constituição desta, onde vão constar informações como: razão social, endereço, objeto social, sócios, capital social, como será administrada a sociedade, prazo de duração (normalmente indeterminado), foro, etc. Após elaborado, para que este ato seja juridicamente valido e tenha efeitos perante terceiros, você deve encaminhá lo para registro na Junta Comercial do Estado onde será a sede da empresa. Acontece que as alterações que venham ser feitas ao longo do tempo no texto do Contrato ou Estatuto Social (no caso das S.A.), deverão sempre ser registradas na Junta Comercial.

As sociedades anônimas, dependendo das disposições de seu estatuto quanto a submissão de temas ao Conselho de Administração e à Assembléia Geral de Acionistas (Ordinária e/ou Extraordinária), deverá encaminhar para registro todos os atos como Atas de Reunião de Conselho de Administração à Junta Comercial, desde que haja deliberação que afete/seja de interesse de terceiros.

Em resumo, a Junta Comercial é responsável por analisar, validar e registrar (aprovar) todos os atos que impliquem em criações ou alterações de características de uma sociedade, quando tais alterações refletirem à terceiros.

Acontece que a elaboração destes atos societários como Contratos e Distratos Sociais (estes são os mais comuns), a muito deixaram de ser exclusividade dos advogados, na verdade, atualmente os profissionais que mais atuam nessas atividades, são os contadores. Porquê? Boa pergunta. Não sei, mas tenho uma “tese”. O direito empresarial e assim como o societário, não são as matérias mais famosas e cobiçadas no universo jurídico, prova disto é o reduzido número de especialistas que temos em tais áreas se comparados aos advogados trabalhistas, civilistas, previdenciários ou criminalistas. Talvez a especificidade destas matérias de cunho empresarial, juntamente com um mercado de atuação reduzido (principalmente aqui no sul do país), acaba por não atrair tantos profissionais. Agora a pergunta, onde está o erro? Advogados ou Contadores? Vale ou não vale a pena?

Eu já admiro os contadores pela sua aptidão com números, mas quando falamos de atividades de registro publico mercantil, me torno ainda mais fã destes profissionais. Eles viram uma oportunidade de ouro, oportunidade que nós juristas desconsideramos, simplesmente por não se realizar no seio do Poder Judiciário e dos “grandes” e “belos” Tribunais. Querem ver alguns dados que comprovam que belo mercado os contadores absorveram quase que completamente? Vamos lá:

Estado do Rio Grande do Sul

Constituições

Em 2015 = 116.200 empresas (isso mesmo, cento e dezesseis mil e duzentas empresas), uma média de 9.683 empresas por mês!!!

Em 2014 = 77.656 empresas, uma média de 6.471 empresas por mês.

Alterações

Em 2015 = 102.018, uma média de 8.501 por mês, e mais uma vez um enorme crescimento exponencial de demanda!

Em 2014 = 81.114, uma média de 6.759 por mês.

Fonte: Junta Comercial/RS – (http://www.jucergs.rs.gov.br/p_estatisticas.asp)

Entenderam o que os contadores viram, que os advogados não viram? Isso, exatamente, um baita mercado!

Mas nem tudo nessa vida é dinheiro, antes, está o conhecimento! Além de ser um mercado formidável, as atividades inerentes aos registros públicos mercantis, demonstram se de grande valia para os alunos e profissionais de direito que querem trilhar o caminho do direito empresarial e/ou societário, explico. As Juntas Comerciais, somente aprovam um ato se eles estiverem completamente em conformidade com as normas legais, é feita não só uma análise de forma, mas também de direito, questões como prazos de convocação, quóruns de deliberação, ausência de informação legalmente exigidas, e muitas outras coisas, são verificadas e exigidas. O que isto gera? Gera um profissional mais atento aos detalhes, e que certamente se debruçará muito mais sobre as legislações que tratam das atividades empresariais e tipos societários (grande parte regulamentada pelo atual Código Civil, Lei 10.406/02).

O que muitos desconhecem (principalmente nós estudantes de direito), é que as Juntas Comerciais disponibilizam manuais que contém os “passo a passos” para elaboração de todos os atos societários, explicando de forma clara e objetiva coisa simples como número de vias de documentos exigidos, mas também informando coisas mais complexas como quóruns, cláusulas mínimas para um contrato social, formas de liquidação e dissolução, etc. Estes documentos são muito, muito úteis, pois a utilização deles pode e vai te ajudar a não perder tempo, pois se encaminhado o ato na forma correta, você não terá que esperar uma primeira análise dizer que o ato está errado, para depois arrumar e reenviar para mais uma análise (o que acreditem leva tempo, e quando falamos de atos societários, a única coisa que não podemos perder é tempo).

(Ah, os manuais do Departamento Nacional de Registro do Comércio – DNRC e da Junta Comercial do Rio Grande do Sul – JUCERGS sobre as sociedades limitadas serão disponibilizados no fim desse post.)

Para finalizar, explico de onde tirei isto de que os advogados abandonaram as Juntas Comercias. Em uma palestra ministrada por um Vogal (pessoa responsável por analisar e aprovar ou não os atos enviados para registro na Junta Comercial) em parceria com um grande escritório aqui de Porto Alegre/RS, houve um desabafo, as palavras deste Vogal foram: “que saudade dos advogados nos corredores da Junta Comercial, tenho falado com amigos de outros estados, e todos tem este sentimento”. Que conste, não estamos falando mal dos contadores, pelo contrário, admiramos e muito eles (inclusive, em razão da prática, muitos tem mais conhecimento jurídico do que a grande maioria dos advogados no que diz respeito à atos societários).

Em fim, um pedido aos juristas que nos lêem. Lembre das Juntas Comerciais! Há nestas, duas coisas essenciais à um profissional que tem interesse pela área empresarial, sendo, mercado e conhecimento! Dificilmente achamos os dois juntos assim, aproveitem!

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