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Aplicação da desconsideração da personalidade jurídica pelo STJ


Publicado em:
01/07/2024
Maria Do Carmo Paiva Dos Santos
Maria Do Carmo Paiva Dos Santos
Estagiário

O Instituto da Desconsideração da Personalidade Jurídica permite que o véu da pessoa jurídica seja levantado e assim se proceda a responsabilização “do administrador, gerente ou representante legal da pessoa jurídica, que, ao agir em seu nome, pratica ato lesivo aos interesses de terceiro, em abuso de poder ou desvio de finalidade da sociedade”.1
A doutrina pondera que o sócio, “ultrapassando os preceitos de legalidade, praticando atos como sócio, contrários à lei ou ao contrato, torna-se pessoal e ilimitadamente responsável pelas consequências de tais atos”.2
Os limites da responsabilização decorrente da desconsideração da personalidade jurídica atribuídos pela doutrina para que haja a responsabilização diretamente pelo sócio, são no sentido de imputação. Segundo Oliveira, para que seja aplicada a desconsideração, é necessária a presença da responsabilidade subsidiária por dívida alheia. No caso da imputação, “quem criou a aparência ou se comportou contraditoriamente responde por ato próprio”.
Nas palavras de Marcelo Dantas, se a lei permite que os sócios ou administradores sejam responsabilizados não se trata de desconsideração, mas sim de responsabilização direta, em virtude de ação ultra vires, isto é, além das forças do que lhes permitem os estatutos, ou por violação a estes, à lei etc. É o caso das normas tributárias ou societárias (CTN, Lei das S/A e outras).
Um exemplo3 dessa responsabilização direta está no art.117 da Lei nº. 6.404, de 1976 sobre as Sociedades por ações, em que declara que o acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados com abuso de poder, enumerando as modalidades de exercício desse abuso.
Há o equívoco do enquadramento dessas hipóteses em desconsideração da personalidade jurídica, mas que não o são, até porque sua existência não faz necessária a suspensão da autonomia patrimonial da entidade, um a vez que, mesmo com esta, os responsáveis podem ser diretamente imputados por fato ou ilícito próprio.4
Para doutrina é necessário provar a prática de fraude ou de abuso de direito pelo sócio ou pelos sócios para que haja a desconsideração. Fraude, para fins da desconsideração da personalidade jurídica, tem o sentido de ocultação da verdade e “se funda na prática de ato lesivo a interesse de terceiros ou da coletividade, ou seja, em ato, onde se evidencia a intenção de frustrar-se a pessoa aos deveres obrigacionais ou legais”5. É o que está disposto no art. 50 do CC.
Segundo Ana Frazão, pouco importa que não haja menção expressa à fraude ou ao dolo no art. 50 ou 187, CC, tendo em vista que a definição geral de abuso de direito abarca, com maior razão, as modalidades intencionais, raciocínio que se aplica integralmente às hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica6
Para o STJ, o instituto tem caráter excepcional e decorre da análise, em instância ordinária, de vícios que configurem o abuso de direito, no caso concreto. Há uma lacuna no tocante ao não preenchimento dos requisitos para aplicação do instituto de desconsideração da personalidade jurídica.
Assim como no tocante ao objeto ato ilícito previsto no §1º do art. 50, que engloba atos para fins ilícitos, abusivos ou fraudulentos. No caso de dúvida quanto sua ocorrência, o STJ remete os autos ao Tribunal de origem para que os atos sejam descritos e valorados, ou invoca óbice a Súmula 7, pois entende a necessidade de rediscussão de matéria fática, com o revolvimento de provas para rever o entendimento aplicado em primeira instância.
Embora a doutrina considere superados os conceitos referenciados à teoria menor, ainda é frequente na jurisprudência a distinção entre a Teoria Maior disposta no artigo 50 do Código Civil e a Teoria Menor atinente aos casos de direitos dos consumidores devido à interpretação dada ao artigo 28, parágrafo 5º, do Código de Defesa do Consumidor.7
O Ministro Villas Bôas Cueva8 faz essa diferenciação presente em casos jurisprudenciais, sobretudo no STJ, pois a primeira lei a prever expressamente a teoria da desconsideração da personalidade jurídica foi o Código de Defesa do Consumidor − CDC (Lei n. 8.078/90), que foi promulgada quase vinte anos depois da apresentação da doutrina por Rubens Requião.
Após o CDC, o instituto da desconsideração da personalidade jurídica foi abordado pela Lei Antitruste (Lei n. 8.884/94), pela Lei do Meio Ambiente (Lei n. 9.605/98) e, finalmente, pelo Código Civil de 2002, que revogou o Código Civil de 1916.9
A teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica corresponde à ideia de que a desconsideração não depende de requisitos, bastando o não pagamento de um crédito.
Assim, não são suficientes para que possa presumir o preenchimento dos requisitos do art. 50 do Código Civil10 e, caracterizar o incidente. Logo, só é possível a responsabilização pela desconsideração da personalidade jurídica fora da esfera consumerista respeitante ao Código Civil, por incidência da Teoria Maior, especificamente quando houver comprovado abuso da personalidade jurídica, no caso concreto.

Referências:
1 Manual Elementar de Direito Civil, vol. 1, 2ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2002, p. 247
2 REQUIÃO, Rubens. Manual de Direito Comercial e de Empresa: Teor ia Geral da Empresa e Direito Societário, vol.1, 9ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 589
3 Lei nº. 6.404, de 1976 Sociedades por ações
art.117, item e) induzir, ou tentar induzir, administrador ou fiscal a praticar ato ilegal, ou, descumprindo seus deveres definidos nesta Lei e no estatuto, promover, contra o interesse da companhia, sua ratificação pela assembleia
4 DANTAS, Marcelo Navarro Ribeiro. “O projeto do novo Código Comercial e a Desconsideração da Pessoa Jurídica”. In: COE LHO, Fábio Ulhoa; LIMA, Tiago Asfor Roch a; NUNES, Marcelo Guedes. (Coord.). Reflexões sobre o projeto de Código Comercial. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 343
5 SILVA, Oscar José de Plácido e. Vocabulário Jurídico. 22ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 637
6 FRAZÃO, Ana. “Desconsideração da personalidade jurídica e tutela de credores”. In: COELHO, Fábio Ulhoa; RI BEIRO, Maria de Fátima (Coord.). Questões de Direito Societário em Portugal e no Brasil. Coimbra: Almedina, 2012, p.489.
7 Art. 28.CDC: O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.
8“a teoria menor de desconsideração da personalidade jurídica, diferentemente da teoria maior, não exige prova de fraude ou do abuso de direito, tampouco depende da confirmação de confusão patrimonial, bastando que o consumidor demonstre o estado de insolvência do fornecedor ou que a personalidade jurídica representa obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos” Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/25082021-Teoria-menor-de-desconsideracao-da-personalidade-juridica-prevista-no-CDC-nao-atinge-administrador-nao-socio-da.aspx
9 CUNHA, Fernando Antônio Maia da. Autonomia patrimonial das sociedades limitadas vs. desconsideração da personalidade jurídica p. 87
10 Art. 50. CC: Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.

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